Apesar de atualmente possuir incontáveis variações na técnica originalmente descrita, o protocolo básico da técnica de CL consiste na compactação lateral de cones acessórios, realizada por meio de um espaçador cônico de aço inox ou níquel-titânio que é introduzido sistematicamente ao lado do cone principal de guta-percha para abrir espaço para os cones acessórios. A ideia central da técnica baseia-se na obtenção de uma maior quantidade de guta-percha no canal objetivando, portanto, a redução na camada de cimento no canal, uma vez que os cimentos endodônticos possuem menor estabilidade dimensional em longo prazo.
No entanto, apesar de aparentemente estandardizado, existem diversos aspectos da técnica que são pouco ou mesmo não padronizados. Questões como qual deve ser a conicidade ideal do canal radicular para realização da CL que permita a maximização da guta-percha no canal radicular; qual a força adequada durante a penetração do espaçador que permita o incremento da massa de guta e ao mesmo tempo não cause trincas ou fraturas radiculares; qual o tamanho e a conicidade adequadas ao espaçador; qual o tipo de cone acessório deve ser utilizado, etc. A ausência de um padrão técnico definido implica em variações na técnica que por fim resultam apenas na geração de muitas inverdades sobre o real desempenho da mesma. Acredita-se e ensina-se mundo afora, por exemplo, que compactar a guta-percha aumenta tanto a capacidade seladora da obturação quanto o índice de sucesso clínico do tratamento endodôntico; que o uso de espaçador ajuda na redução de falhas na obturação; que a aplicação de forças leves no emprego do espaçador não promove trincas ou fraturas radiculares; e que a qualidade radiográfica da obturação é melhor após a CL.
Com base em percepções clínicas, muitas vezes apenas alicerçadas em intuições pessoais, escolas de endodontia, professores, e até mesmo fabricantes propõem a sua técnica ou variação de técnica de “melhores resultados”. Neste aula buscamos descontruir, à luz das evidências científicas, conceitos enraizados sobre o desempenho da técnica com especial enfoque em suas limitações, bem como enfatizar os riscos de causar danos irreversíveis à estrutura dentinária, tais como defeitos dentinários e/ou trincas e fraturas. Demonstramos, portanto, que o objetivo central da técnica de CL (aumentar a densidade apical de guta-percha) não é alcançado de modo previsível e seguro, o que pode indicar que a compactação da guta-percha não seja essencial na obtenção do sucesso clínico em endodontia. Ao final apresentamos uma técnica de obturação que pode se tornar em uma alternativa para o ensino endodôntico na graduação, muito mais simples, rápida e com menor curva de aprendizado, baseada na não compactação da GP, que chamamos de NCT (non-compaction technique). Como conclusão, o essencial é observar que não há evidências na literatura que demonstrem que o uso de espaçador implica no aumento da densidade apical de guta-percha modo previsível e seguro, o que coloca em cheque os objetivos da técnica e seu real papel na obtenção do sucesso clínico.