Limites Apicais de Instrumentação e Obturação: verdades e mitos.
Existem 2 fatores biológicos associados ao sucesso do tratamento endodôntico.
O 1º é o tecido conjuntivo do ligamento periodontal, responsável pelos processos de defesa contra os agentes agressivos oriundos do canal radicular.
O 2º é a conhecida causa das alterações pulpares que é microbiana, após a instalação da doença.
O local da instalação da estrutura suporte para o desenvolvimento das colônias de bactérias é o biofilme, formado nas paredes do canal radicular, mais propriamente na camada da pré-dentina.
Esse biofilme ocupa todas as paredes dentinárias incluindo o forame apical. Os micro-organismos e seus produtos tóxicos ficam confinados no sistema de canais e não conseguem atingir o ligamento periodontal, a não ser através do forame apical e dos canais laterais.
Dessa forma, dentro dos limites impostos pela anatomia, é necessário ter acesso do forame apical através da patência com limas finas, seguido pela ampliação do forame com objetivo de limpeza do biofilme naquela área.
Portanto, o limite apical de instrumentação não deve ser limitado ao interior do canal, e sim ultrapassando o limite do forame para limpar a área e evitar bloqueio do canal com raspas de dentina, provocando zips ou desvios indesejáveis.
Após a limpeza, é fundamental o selamento do forame apical através da obturação do forame apical e dos canais acessórios com o cimento obturador que deve ser comprimido para a região através de compressão hidráulica vertical de cone de Guta-Percha previamente posicionado a 2 mm aquém do comprimento real do canal, plastificado pelo calor e comprimido por um condensador vertical fino.
Nos dentes com polpa vital, os procedimentos devem ser idênticos com objetivo agora, de remover todo o tecido pulpar. Histologicamente, o tecido conjuntivo pulpar, não difere do tecido conjuntivo do ligamento periodontal, portanto sua remoção pode ser feita em toda extensão do canal até o ligamento periodontal.
O selamento apical, também deve ser intencional até o limite do canal radicular. O extravasamento intencional do cimento será invariavelmente encapsulado pelo tecido conjuntivo. Dependendo do tipo de cimento, este poderá ser reabsorvido ou continuar encapsulado sem prejuízo para o organismo.
Prof. Mario Leonardo
O Prof. Mario Roberto Leonardo discorreu sobre o limite apical de instrumentação e obturação em dentes com vitalidade pulpar e dentes com lesão periapical com base em corte histológico realizado em dentes humanos.
Enfoque especial foi dado aos dentes com nítida lesão periapical onde ficou evidente a necessidade do desbridamento foraminal e da realização do batente apical.
Considerando que o limite de instrumentação é o limite de obturação, nestes casos o limite de obturação deverá ficar a 1 mm aquém do forame. Dessa maneira é muito importante o material de obturação empregado.
Assim o Prof. Leonardo destacou as propriedades físicas, químicas e biológicas dos cimentos de obturação AH Plus e EndoREZ que demonstraram através de cortes histológicos a excelente tolerância tecidual mesmo em casos de extravasamentos.
Evidências em casos de extravasamento com EndoREZ, revelaram extensa atividade macrofágica a nível periapical e indução de tecido mineralizado envolvendo o forame apical e circundando o material extravasado. (o belíssimo corte em HE surpreendeu todos os presentes na sua histórica apresentação).
O prof. Mario Leonardo relatou que participou recentemente de um simpósio na Argentina, cujo tema foi “A lima patência é importante?”. Domenico Ricucci, Fernando Goldberg e M. Leonardo concluíram que nos casos de biopulpectomia, a partir de uma lima nº 10, a patência promovia o desvio do forame, uma vez que nos casos de biopulpectomia a lima patência mesmo a partir da lima tipo K nº 10 promove um desvio do forame e nos casos de dentes com nítida lesão periapical naturalmente empregando-se uma lima de maior diâmetro corre-se o risco de levar substâncias tóxicas para a região periapical. Concluiu-se que a lima patência não deve ser empregada, diferentemente do que ocorre entre muitos endodontistas no Brasil.
Prof. Clovis Monteiro Bramante
2. Segundo pesquisas desenvolvidas por Bramante et al. sobre instrumentação, técnicas termo-plastificadas e condensação lateral usadas na obturação, podem causar microfraturas. Vários cortes foram mostrados durante a sua apresentação para justificar a sua afirmação. Microfraturas poderão apresentar sintomas a longo prazo.
3. Extravasamento: Técnicas rotatórias e manuais provocam extrusão de detritos (raspas de dentina contaminada).
4. Limite de obturação: Citou Eugênio Zerlotte Filho. 1959: “O limite da obturação é o limite de instrumentação”. Este conceito também foi citado pelo Prof. Mário Roberto Leonardo. Salientou também que evidências confirmam que Guta-Percha não reabsorve.
Ficou demonstrado o alinhamento de ideias entre o Prof. Leonardo e o Prof. Bramante em relação aos limites apicais de instrumentação e obturação, patência, respeito ao periápice, preservação do côto pulpar em casos de polpa viva e ênfase a endodontia biológica.
Chamou atenção o fato do Prof. Bramante e Prof. Leonardo apresentarem as suas ideias com altíssimo nível de evidências científicas.
Prof. Ruy Hizatugu
1. A minha participação foi modesta porque apenas atuei como coordenador. Coordenador não fala. Coordenador, coordena.
2. Os limites apicais foram baseados em evidências de estudos publicados:
3. O limite de instrumentação é no forame apical, após racional e biológico pré-alargamento dos terços cervicais e médios dos canais radiculares.
4. O limite de obturação (travamento do cone mestre) é 1 a 2 milímetros da constrição apical.
5. O Glide Path (incluindo patência do forame apical) é fundamental para o êxito do tratamento endodôntico.
6. Sobreobturação com cimento (surplus/botões apicais e laterais) são altamente desejáveis. É o atestado da obturação tridimensional.
7. Em toda atividade é importante trabalhar com muita delicadeza para se evitar traumas e trincas radiculares, de sérias consequências a longo prazo.
8. Evidências são importantíssimas na decisão clínica. O clínico se curva diante das evidências. Evidências se curvam diante da verdade clínica.
9. Os três pilares que comandam a endodontia são: 1. Domínio da Anatomia. 2. Controle da Infecção. 3. Blindagem Dental.
Saudações.
CIRURGIÃO DENTISTA
ESPECIALISTA EM ENDODONTIA – FOP – UNICAMP
ESPECIALISTA EM BIOLOGIA CELULAR E HISTOLOGIA – UNIFESP
LIVRE DOCENTE EM ENDODONTIA – UNIVERSIDADE GAMA FILHO